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Aula de Catequeje (corrigido = compreennsível)


sinto-me perdida. sinto-me melancólica, sem explicação inteligível. sinto-me fraca, diminuída, menos. sinto-me menos do que eu (sem me lembrar de quem me sentia ontem) e menos do que os demais. sinto-me perdida em tanto sentimento, diluída.

Hoje, na minha querida catequese, foi a confusão. 5ºano.

Saio de casa para a dita catequese e estou ligeiramente ensonada, ligeiramente cansada, ligeiramente sem paciência.
De cada vez que eu começava a falar para eles de algo essencial, do tipo: "Porque é que temos o direito de dizer que somos feitos à imagem e semelhança de Deus?" (se ninguém o viu de forma explicável) ou então "Porque é que podemos sentir beleza na patacuada inocente da "Criação do Mundo em 7 dias -faça você mesmo, cara"?", acontecia que aqueles pirralhos começavam a brincar e a divertir-se em frente aos meus olhos.
E se até aos dias de hoje e no ano passado até tinha funcionado (sobretudo porque tinham todos um desenvolvimento cognitivo muito semelhante), hoje decidi que aquilo não era forma de se dar catequese. E que eu era muito mais do que alguém que mandava calar. E que eles já têm inteligência para compreender deveres, respeito e liberdade condicionada.
E fui enviando-os para o castigo, sentados numa cadeira do lado de fora da sala de catequese, sem tentativas de apurar culpas ou causas.
Quem falava ao mesmo tempo que outro e sem levantar o dedo ia pa rua.
E lá fui controlando a coisa.
Chegou o ponto em que decidi que nem assim eles conseguiam manter-se rectos.
À custa da meia dúzia de pirralhos egocêntricos (educados na Primária em Colégio - o que eu considerava benéfico) estava uma outra metade a olhar para eles e para mim com olhares furiosos.
Para esses outros a catequese é literalmente uma merda. À custa de uns pirralhos mimados e egocêntricos (que não compreenderam tão bem como os demais que não se tem direito a negociar castigos, silêncios, levantar dedos pa falar, etc etc) tenho-me desdobrado em explicações carinhosas acerca do dever de todos ficarmos calados como forma de todos nos ouvirmos e conseguirmos falar.

Hoje revoltei-me.
Não gritei com ninguém.
Mas vesti a minha máscara de militar. Aquela que uso quando lido com os meninos da Fundação, em Louléi. As ordens eram para cumprir de verdade. O que eu decretasse teria que acontecer, sem negociações.

Então, fiz inteligentemente a pergunta: "Quem é que quer aprender mais coisas de catequese hoje?" A metade não-pirralha levantou prontamente a mão. E a outra metade começou a contar quantos tinham levantado a mão e a gozar com eles.
Ao que eu remato "Então, quem não levantou a mão sai." Lentamente, com alguma perplexidade, lá foram em silêncio, um de cada vez (segundo um efeito dominó e de espírito de equipa) levantando a mão. Deixei passar.

Perante este sinal de seriedade minha, uma menina que é mais velha 2 anos do que os restantes levantou a mão e perguntou-me: "Huuh. Hum. Não sei se posso.. Hum.. Não, deixe estar catequista.. Huuum. ... Como é que quando rezamos sabemos que Jesus ou Deus nos ouve?" (Isto com sotaque brasileiro, o que faz com que a pirralhada goze com ela)
Juro-vos. Correram-me, passearam-me, galoparam-me coisas boas pela mente.
As perguntas às quais eu gosto de responder.
Sobre as quais gosto de pensar.
Pude oferecer-lhes isso durante cerca de 3s. Senão vejamos: Respondi que não sabia. Mas que confiava. E perguntei que nome se poderia dar a isso. Fé.
Até que começou a anarquia. Cada um tinha outra uma história, divagação, opinião para contar sobre o assunto. E começaram a contar cada um a sua. Em anarquia.
Tomei a decisão de ser militar outra vez e a primeira que falou depois da minha firme decisão mental, "mandei" para a rua. Despedi-me, inclusivé, dela até à próxima 4ªfeira. Ela tentou negociar. Ignorei-a. Saiu e pôs-se ali no canto, do lado de fora da porta da sala de catequese.

Chegou o Sr. Pe.
Eu até tremo. Sempre que ele passa por lá tenho um puto no castigo. Às vezes tenho vergonha. Lol. Mas podia ser pior. Pelo menos os que estão lá dentro estão em silêncio.

E hoje revoltei-me.
E depois, a partir daí, até ao final da catequese o nível de conversa religiosa, crente, cultural, católica e sobre outras profissões diferentes das nossas evoluiu para um nível que eu nunca vira entre eles. Eu estava ruim. E estava militar. Mas só quando fazia falta. E não conseguia conter o sorriso.
Terminei a catequese com uma coisa maravilhosa.

Dei-lhe o nome de exercício (se fossem mais velhos teria-se dado o nome de meditação, por ser mais airoso).
Propus que se fechassem os olhos e que se voltasse a ver o filme do nosso dia. Então, poderíamos procurar sentir um sentimento bom que se teve em algum momento do nosso dia. E fiz o mesmo, ali, em frente a eles, a olhar para baixo para os meus sapatos e a pensar que já precisavam de graxa.
E eles calaram-se.
E meditaram.
De olhos fechados.
Eh pah. Fiquei abismada. De repente aqueles pirralhos estavam a meditar. E em silêncio.

No final do exercício lá tentei explicar que trazer a nós outra vez um sentimento bom do nosso dia (sobretudo se conseguirmos fazer isso quando nos vamos deitar, porque é quando temos mais tempo e quando nos preparamos para uma parte importante de descanso, durante a qual podemos ser visitados - isto tudo segundo a ideia que um deles sugeriu) estamos a colocar coisas boas no nosso coração.
E que isso é, então, mais do que rezar com palavras que não conseguir pensar. Rezar é estarmos concentrados, focalizados.
Isto porque Deus e Jesus falam todas as línguas apenas porque não falam nenhuma. Sentem o nosso coração e o nosso pensamento. (O que eles ainda não sabem é que o pensamento é construído a partir da linguagem, que deriva da língua que falamos, e como tal pensar é usar uma língua, diferente em cada parte do mundo - "Ó catequista, lá nos Nartes-Unidos-da-América ou isso, como é que eles rezam e Deus os consegue perceber? - o que eu me ri cá dentro!!!)
E se relembrarmos coisas boas do nosso dia, para além de as podermos agradecer (coisa inteligível para eles, embora eu a refira), treinamos os nossos olhos para vermos cada vez mais coisas boas e falamos com Deus cheios de sentimentos bons. E assim, durante o nosso sono, podemos ser visitados por coisas boas.

Por outro lado, se pensarmos mais em coisas más do que em coisas boas, ou se estivermos a pensar em tudo ao mesmo tempo, ou se pedirmos que as coisas más mudem, é como se usássemos uns óculos que nos deixam ver as coisas más (que metáfora brilhante que eu tiiiive! :D).
E isso é normal, acontece com toda a gente . Toda a gente tem dias em que só tem postos os óculos que só nos deixam sentir as coisas más("Ahahahahaha! A catequista tem 2 pares de óculos!!" Ao que eu remato com um olhar furioso, como quem diz sem ter dito, se não te calas, vemo-nos na próxima 4ªfeira).
Mas foi tão bom agora relembrarem um sentimento bom do vosso dia!
Mostrar e viver esse sentimento bom é uma oração melhor do que rezar as Avé-Marias e os Pai-Nossos todos do mundo.
E, depois, convidei quem quisesse a partilhar qual tinha sido o seu sentimento bom.
E a catequese terminou então com uma oração que eu invento, como de costume.
Não gosto de pôr os miudos a rezarem as Avé-Marias e os Pai-Nossos do costume (embora eles queiram sempre, porque é mais fácil e fica logo a coisa despachadinha).
Intangível para eles.
Rezámos todos, de mão dada, num silêncio forçado e ameaçado de castigo, para que esta noite conseguíssemos todos sentir novamente um sentimento bom do nosso dia. Desejo-te muito isso.



Olhar para o profundo e alto dos nossos sentimentos

E houve uma menina que se portou mal e que pediu muito para ir de mão dada comigo até à saída, coisa que eles já não fazem com a idade deles. E queriam todos abraçar-me e irem para baixo ao meu lado.

Mas eu garanto-vos que me passei com aquela pirralhice toda. Mas depois, enchi-me de bondade com aquela conversa de alta-qualidade, que muitos meus conhecidos não alcançam. Meu bom Deus.


Muitas vezes relembro as minhas férias de Verão com um sentimento bom.

Hoje o meu sentimento bom foi a sensação que eu tive, por um segundo, durante esta tarde que conseguia ter de verdade boa nota no teste de Oftalmologia de amanhã. Tenho fé que se me agarrar a esse sentimento não me faltará a força. Não será já isso Deus em nós? :P

Comentários

  1. sinceramente bonito!

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  2. Trés bien...sra catequista..;)

    Qualquer dia qd m readicionares (eu fui pra rua por tempo indefinido...lol) gostava de discutir alguns pontos de vista religiosos...

    Talvez um dia...qd despires o teu "fato militar":P

    ResponderEliminar
  3. Terá sido indefinidamente?

    ResponderEliminar

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