Avançar para o conteúdo principal

Querer mais o Sim que o Não? Posso?


Não é que se importasse, mas comer tinha-se tornado para ela uma obrigação.

Temos, todos, pequenos prazeres escondidos. E os dela eram os petiscos maravilhosos que só no imaginário existiam. E a real realidade não se coadunava com isso.
A solução, ainda que tenebrosa, passaria por ser ela a cozinhar.
Ajustar a realidade ao imaginário passa por ser-se activo.

Aquilo que não nos vem naturalmente, e que reconhecemos ser importante para nós, tem que vir activamente.
Somos a mancha que somos, mas ainda assim podemos tentar activamente ser mais.
Há dificuldades mutilantes com as quais lidámos a vida toda. E é possível que tenhamos tentado mudar partes de nós, vezes e vezes. Decisões de ano novo. Decisões de aniversário. Sonhos depois de sessões de cinema. E tentámos. E nada aconteceu. Diz-se que depois dos 18anos apenas 2% da nossa personalidade pode ser alterada.
Não me importa grande coisa saber que não vou conseguir, de facto, mudar.

Reconhecer que não gosto disto ou daquilo e empreender-me com sinceridade para ser outra coisa é uma cruzada.
É uma viagem de resistência. Lutar, lutar lutar, numa luta perdida à partida. Mas numa luta que me leva mais além. Quando chegar a hora de olhar para trás e avaliar a cruzada, saberei que me empreendi por inteiro. E que ainda assim não foi possível. Quando se caminha em consciência, quero eu querer, o que importa não é a expectativa de onde se vai chegar, é a paixão com que se empreendeu a viagem.

Sei que comer tinha-se tornado uma obrigação.
Sei que não é modo de se viver.

Estudo. E sonho em empreender, depois disso, uma nova cruzada - um curso de culinária.

Adoro cozinhar e falta-me o saber, falta-me a ciência.
É o ponto da situação.
Ponto de chegada: que comer não seja uma obrigação.
Ponto natural de chegada: comer continue a ser uma obrigação.
Moral da história: rezo, alegremente, qual criança inconsciente, de joelhos à cabeceira da cama de mãos cruzadas "Meu Deus, ajuda-me a conseguir sentir que é possível. Ajuda-me a continuar erguida a caminho deste sonho. Faz com que ele se concretize. Por favor por favor por favor por favor."
Sabedoria da história: "Meu Deus. Seja a minha vida caminho onde estejas visivelmente presente. Hoje a minha vontade é aprender a cozinhar eloquentemente. É comer com prazer e com tempo e com cor e com sabor. Faça-se na minha vida a tua vontade. Alimento este desejo. Mais que querer o curso como próxima missão, quero que estejas comigo. Não quero mais o curso do que o não-curso. E se depois de toda esta conversa eu quiser um curso de DJ em vez de culinária, gostas de mim na mesma?"

Comentários

  1. "Quando me parecer difícil, lembra-me que não sou chamada a conseguir, mas a ser fiel."

    ResponderEliminar
  2. Sim! É isso! Demorei a "chegar lá" e sei que às vezes ainda me perco. Mas volto! ;)

    ResponderEliminar

Enviar um comentário

Mensagens populares deste blogue

O Primeiro Amor - Miguel Esteves Cardoso

É fácil saber se um amor é o primeiro amor ou não. Se admite que possa ser o primeiro, é porque não é, o primeiro amor só pode parecer o último amor. É o único amor, o máximo amor, o irrepetível e incrível e antes morrer que ter outro amor. Não há outro amor. O primeiro amor ocupa o amor todo. Miguel Esteves Cardoso – Os Meus Problemas (1988)

Avolia - Porque sonhar às vezes custa

Está mais do que visto, na minha vida, que este expôr e re-expôr que se deve fazer O QUE APETECE não é à medida do meu mundo. Estas últimas semanas de avolia foram o expoente disso. Há estadios intermédios nos quais o que apetece é o nada. E o nada, agora, não me leva onde eu quero. Quando me concentro com muita muita força, re-sinto como sendo meus aqueles projectos, sonhos, devaneios nos quais já não acreditava. Não acreditar. Não apetecer. Clinicamente, chamamos-lhes desesperança e avolia . Caracterizam, entre outros, o estado de não-querer-ser . Não-se-querer-conhecer-no-expoente-máximo . Mesmo havendo réstias do querer, não conseguir. É o não ver razões para. Então, aquilo que apetece fica-se pelo medíocre . E depois fica-se pelo nada . E ir atrás do que apetece é menos do que o óptimo. Por isso, nem tudo nem nada. Vejo, agora, que é importante haver planos e disciplina. Vejo, agora, que é importante manter-se efectivado a directivas a cumprir. Mesmo que não apeteça, houve um dia

Vontade de Morrer

Tenho vontade de morrer. Última vontade de desaparecer no mundo. Fusão com o Outro, que corre além de mim. Ser aquilo que sou em suspiro. Suspirar, e ser já, antes da prova, aquilo que sou. Vontade de morrer para, ultimamente, ser. Não ser arrastada ou obrigada ou limitada. Ser. Igual a mim, no infinito. Sem lágrimas, sem dor, sem sofrimentos. Ser. Com o Tudo de Tudo, no mundo do infinito sem igual. Morrer para ser.

Que nunca ninguém diga a outro que não é capaz!

"Que nunca ninguém diga a outro que não é capaz. Que nunca diga o que pode ou não pode fazer, do que é ou não é capaz. Ninguém sabe o que vai dentro das paredes, ninguém sabe o que corre nas artérias, a que velocidade, com que fúria, com que dor. Ninguém sabe nada senão de si mesmo, e muito bom é quando se sabe de si mesmo, quanto mais pensar saber dos outros. Impor limites ao seu semelhante é est ender-lhe dores e frustrações próprias, é projectar nos outros os nossos próprios receios, é achar que se eu não consigo, se eu tenho este problema, então também tu, por muito que queiras, os terás. Se eu não sou capaz, tu também não. Se a mim custa, a ti custará mil. Tristes profecias. Todas de desgraça. A experiência não é transmissível. Sabe quem vive. Sabe de si. A experiência dos outros é outra vida. Não é a nossa."

mais Amar e Servir

Jesus, será que a minha vida é orientada para Ti? Para mais Te amar e servir? Ao serviço de quem amo? Ao serviço da humanidade que acarinho? Aquilo que faço é para o meu ego, para o dinheiro, para a vida rica e com pouco trabalho? Ou aquilo que faço é orientado para Ti? Eu amo a vida. Eu amo sentir que estou Orientada para e por Ti. E perco-me. E sorrio no mundo leve e célere e pressionante e que quer sempre mais. Eu quero mais e mais. E não olho para quem sou. E a Ti regresso. Contigo me sento. A Ti entrego o meu dia. Para mais Te amar e servir.

Recomeça se puderes

Sísifo Recomeça... Se puderes Sem angústia E sem pressa. E os passos que deres, Nesse caminho duro Do futuro Dá-os em liberdade. Enquanto não alcances Não descanses. De nenhum fruto queiras só metade. E, nunca saciado, Vai colhendo ilusões sucessivas no pomar. Sempre a sonhar e vendo O logro da aventura. És homem, não te esqueças! Só é tua a loucura Onde, com lucidez, te reconheças... Miguel Torga  TORGA, M., Diário XIII.

Princípio e Fundamento. A Indiferença Inaciana.

“ O homem foi criado para louvar, reverenciar e servir a Deus Nosso Senhor, e assim salvar a sua alma; e as outras coisas sobre a face da terra são criadas para o Homem, para que o ajudem a conseguir o fim para que é criado. Donde se segue que há de usar delas tanto quanto o ajudem a atingir o seu fim e há de privar-se delas tanto quanto dele o afastem.  Pelo que é necessário tornar-nos indiferentes a respeito de todas as coisas criadas em tudo aquilo que depende da escolha do nosso livre-arbítrio, e não lhe é proibido.” in Princípio e Fundamento, Santo Inácio de Loyola A indiferença Inaciana não convida ao desapego como finalidade, mas à direcção dos nossos apegos, conforme nos aproximam ou afastam de Deus. O que me inquieta? O que me traz paz?  O que identifico que vem do mundo? E o que vem de Deus?  O que me frustra? O que me realiza? O ser interior superficial é sempre mais ruidoso e exigente, está ao nível dos nossos desejos mais imediatos e que atrapalham m